Linhas soltas, asas rasgadas

Freedom is just chaos with better lighting.

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quinta-feira, março 27, 2008

Sobre o filme...

A superprodução de um curta-metragem

Cinema é uma arte para super-heróis. Esse pensamento passou pela minha cabeça algumas vezes durante as gravações do meu curta-metragem mais recente, “Superpoderes”. O projeto, selecionado pelo Festival Cultura Inglesa, de quem recebeu patrocínio para ser realizado em mídia digital, contou com o apoio da Academia Internacional de Cinema.
Da AIC veio também boa parte da equipe, de diversas gerações dos programas anuais e intensivos. Uma grande vantagem, por serem pessoas que se conhecem e já trabalharam juntas em outros projetos. Da primeira turma de alunos formados pela AIC, eu (diretora e roteirista) e Janaina Assis (que irá se encarregar das animações e efeitos especiais). Da segunda turma, Tatiane Alencar (editora, agora fazendo seu trabalho na montagem do material recém-captado) e Mariá Gonçalves (responsável pelo som direto e posteriormente pela mixagem). Da terceira turma, Rodrigo Falcon (diretor de fotografia). E a diretora de arte (Sheila Zago), antiga coordenadora de comunicação da Academia Internacional de Cinema. O produtor (Thiago Daher) e a assistente de direção (minha irmã Karen Kreutz), ambos ex-alunos de cursos intensivos. Por fim, o ator protagonista (Victor Ribeiro), também aluno do programa anual de cinema e grande entusiasta da arte cinematográfica.
O roteiro foi inspirado em um conto do escritor britânico H.G. Wells e, seguindo um dos parâmetros do Festival Cultura Inglesa, voltado ao público jovem. “The Man Who Could Work Miracles” conta a história de George Fotheringay, um homem que não acredita em milagres até o momento em que começa a realizá-los. Meu curta-metragem aborda o universo fantástico do conto, mas trazendo o personagem ao século 21, na pele do office-boy Jorge, uma espécie de super-herói adolescente.
Ao descobrir que pode fazer coisas acontecerem apenas pelo poder da vontade, sua primeira reação é de descrença. Um pouco assustado, mas gradativamente animado com as possibilidades, Jorge tenta fazer bom uso de suas novas habilidades. Ele acaba percebendo que lidar com o poder não é tão simples quanto parece.
Para essa livre adaptação, usei como referência visual o universo das histórias em quadrinhos e dos desenhos animados. O mundo quase surreal do protagonista é retratado num tom predominantemente sépia, mas ganha cores fortes na medida em que os poderes do herói começam a se manifestar. Com bom humor, as situações do roteiro se encadeiam num crescendo da euforia de Jorge e seus amigos até emergir uma questão fundamental: de que vale o poder quando não se sabe o que fazer com ele?
Transformar em imagens o que parece tão simples no papel foi meu maior desafio. Foram cinco dias de trabalho árduo, após quase um mês de pré-produção (período no qual foram realizados castings, visitas a locações, reuniões com a equipe técnica, escolha do equipamento e da câmera – uma Panasonic DVX 100 cedida pela AIC, e acordos de parcerias/apoios para o filme). Mas não importa como sejam os preparativos, a execução é sempre muito mais intensa.
No primeiro dia de gravação, cenas em um bar na região da Vila Leopoldina (Atol Bar). Atrasos para retirada dos equipamentos e montagem da luz, muitos planos complexos com travelling, diversos atores e figurantes. Necessidade de adaptar o cronograma. No dia seguinte, ao contrário do planejado, teríamos que voltar para lá.
Segundo dia, garoa e um resfriado que não poderia ser mais inconveniente. Mais cenas no bar, e infelizmente não conseguimos captar todas elas. Uma das atrizes não poderia comparecer. Mas a manhã foi produtiva - em quantidade, gravamos o dobro do que havia sido feito no dia anterior, primeiro pela facilidade dos planos e segundo pelo maior entrosamento da equipe. No começo sempre é preciso “esquentar os motores”, mesmo quando os profissionais envolvidos já se conhecem.
Ainda no segundo dia, a equipe se deslocou do bar para a próxima locação no período da tarde – um apartamento na Rua Augusta. Ótimo para a direção de arte, mas de dimensões um pouco limitadas para a fotografia. Uma parte dos equipamentos foi para lá, outra teve que ir direto para a locação do dia seguinte. Todos conseguiram se espremer no pequeno espaço do apartamento e realizar um bom trabalho, o que parece regra quando se trata de cinema: quanto mais difíceis as circunstâncias ou situações, mais as pessoas dão de si mesmas para que o esforço valha a pena.
Acabamos tarde no segundo dia, começamos cedo no terceiro. A locação, uma casa com diversas obras de arte e objetos que eu temia serem danificados. Felizmente, a equipe tomou todos os cuidados possíveis nesse sentido. Infelizmente, a fiação elétrica antiga da casa fez com que ficássemos sem luz em duas ocasiões, causando um temor ainda maior de que não pudéssemos completar a programação do dia. Anoitecia quando saímos de lá, com um peso a menos sobre os ombros e um excelente material na fita.
O quarto dia das gravações seria somente de externas. Garoa fina e frio em São Paulo quando saímos de casa, eu e boa parte da equipe que se hospedou comigo. Encontramos o restante da equipe e o elenco na frente da Academia Internacional de Cinema, e foi onde montamos nossa base de espera. A chuva precisava parar, pelo menos um pouco, ou diminuir de intensidade. Gravamos uma cena, esperamos mais um pouco, fomos para baixo do Minhocão e gravamos outra, enquanto ainda garoava. Voltamos para Higienópolis e o tempo chuvoso finalmente deu uma trégua. Terminamos tudo o que tínhamos planejado no fim da tarde. Aproveitamos o tempo “livre” para resolver problemas de produção e principalmente prever os que ainda surgiriam, durante a pós-produção.
O quinto e último dia no set teve um sabor agridoce. E já começou com imprevistos. Era um domingo, trânsito calmo, mas uma ponte de acesso à região do bar (onde gravaríamos as derradeiras cenas que faltavam) estava bloqueada. Pegamos outro caminho, atrasamos um pouco e depois compensamos trabalhando mais rápido. As cenas foram externas, na frente do bar (fachada e rua). O tempo colaborou, tínhamos tudo pronto ao meio-dia, corremos para a locação seguinte.
Mais uma vez na Academia Internacional de Cinema, mas agora dentro do prédio, que usaríamos como cenário de um bingo/cassino. Enquanto a equipe de arte preparava os objetos de cena e figurinos, eu gravava alguns planos na porta de entrada com a fotografia, som e atores. Quando passamos para as internas, a tarde já chegava ao fim e foi preciso adaptar muito de minha decupagem para o que poderíamos executar naquele momento. Os últimos planos do dia, e também do filme (ou, como falamos de brincadeira, “take embora”), foram demorados e desgastantes, até porque todos já estavam bastante cansados depois de quase uma semana imersos na captação das imagens.
Mas fechamos as gravações. Alguns membros da equipe, que não moravam em São Paulo, foram embora ainda naquele dia. O clima de despedida se estendeu também às pessoas, causou uma certa depressão pós-filme. Nada que as preocupações referentes à devolução dos equipamentos não pudessem me fazer esquecer. Além disso, ainda tínhamos que prestar contas com a Cultura Inglesa, montar as imagens capturadas e finalizar da melhor forma para que o trabalho estivesse completo.
Atualmente, o “Superpoderes” encontra-se em fase de edição. Em breve teremos o primeiro corte, depois será feita a mixagem de som, inserção das animações e efeitos especiais, criação de uma trilha sonora original. Entregaremos o DVD à coordenação do Festival até o final de abril, e a exibição do curta acontecerá às 21h do dia 6 de maio, na sede da Cultura Inglesa em São Paulo (Rua Ferreira de Araújo, 741, Pinheiros).
Sob o ponto de vista da direção, percebi que ainda estou aprendendo. É importante ter conhecimento e experiências anteriores, o que não me faltou enquanto estudei cinema na AIC (e foi o que me ajudou quando as coisas no set não aconteceram conforme o planejado). Também é importante a escolha da equipe, o que aconteceu de forma natural pelo networking que eu já havia formado, e resultou em uma boa execução do que eu imaginei durante a criação do roteiro. Mas a coisa mais importante talvez seja simplesmente usar os erros e problemas como uma forma de crescer na profissão, não desistir no meio do caminho, ter ânimo para continuar até o final. E só descansar quando o filme estiver pronto, no DVD.
Para quem ainda está em início de carreira, essa é a parte que exige mais esforço, mas também a que trará maiores recompensas futuras. Basta perceber que hoje em dia o cinema está ao alcance de qualquer um que possua criatividade e força de vontade. Nem é preciso ter superpoderes para conseguir... mas até que ajudaria um pouco se a gente tivesse.

segunda-feira, março 17, 2008

Post-production

Time to cut the film...

terça-feira, março 11, 2008

"Call it, friendo"

Superpoderes na reta final da pré-produção. Minha casa virou um albergue, em clima de festa. Trânsito de São Paulo batendo recordes de lentidão. Últimas questões de fotografia resolvidas (at least I hope so). Visita às locações, sem mim. Cólicas inoportunas. Ameaça de chuva, café da manhã cedo demais e agora fome. Decepção ao telefone. Preciso revisar meu roteiro.

terça-feira, março 04, 2008

Conto publicado*

Mãe

Então me largaram sozinha em casa. Já não me preocupo com isso, somente quando dói. O filho hoje não dá pra contar, esses dias como se morasse na casa do namorado. Os tempos são outros. Uma vez chorei na sua frente e se assustou. Não sei se você lembra, mas hoje é feriado no Brasil. Coloco a chaleira no fogão e não sinto minha mão nem parte alguma deste corpo. Parou de doer e agora dorme.
Meu conforto, pesadelos sem ter que ir pra cama. A televisão ligada, nem assim sou capaz de ver. Controle cai no chão e quebra. Presto mais atenção nas sombras que fazem quadrados na parede, luz nascida no poste da rua. E ninguém faz nada a respeito. Sempre assim nesta casa. Antigamente eu tinha que aceitar com mais facilidade.
O marido lembra de avisar que está no bar com o primo. Dócil, eu me esforço e acredito que sim. Vai dormir em casa? Não se sabe. Talvez fosse o caso de cometer suicídio esta noite, se apenas pra quebrar a rotina. Ele, cuida que já morreu há tempos, por detalhe esqueceu de cair. Todo dia aquele cigarro na mão e a vontade de largar tudo.
E ele fala amor como se fosse o pão francês comprado na esquina. Qual valesse nem dez centavos. Também, nunca fui além da vontade de me agarrar nessa tábua de salvação. Na minha situação, qualquer uma. O mar sempre tão pequeno.
Nunca escolhi ser dona desta casa, nem importou meu querer. Na época, a mãe aprovou o casamento. Pudesse voltar, destino empresária. Dona da própria vida, para o inferno com os outros. Mulher não tem escolha, disse a mãe. Agora isso.
Eu, ponto no meio de coisa nenhuma. Pouco a declarar, mas o imposto de renda insiste. Tenho quadros pendurados na parede. Cadeiras de vime e bebidas com rolhas fechadas. Ainda tenho família, e para quê?
Faltou pensar no almoço de amanhã. Daqui a duas semanas é o meu dia.
No mapa da Via Láctea, uma flecha aponta: você está aqui. Mas o grão que sou eu já não conta números no universo. Segue desnorteando, no deserto da espera por um abraço que falhou em vir. E mesmo viesse, bem duvido que acabasse satisfeita.
A chaleira apita. O chá está pronto, a ser servido em um minuto.

*Menção Honrosa no VI Prêmio Escriba de Literatura.


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