Linhas soltas, asas rasgadas

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quarta-feira, agosto 29, 2007

As rodas

Não sabem quem são. Olham para as pessoas e talvez se perguntem onde encaixar seu nome na máquina barulhenta que engole o planeta. Não entendem o tempo, nem suas engrenagens endurecidas de ferrugem. O chão em movimento, segurando pés que se sustentam de forma instável. Cair a qualquer momento, mas vão em frente.
Os homens dentro de veículos abafados são sacudidos como sementes na ceifadeira, prestes a romperem suas cascas e serem esmagados por barras de ferro. O termômetro eletrônico na rua marca uma quantidade elevada de graus, mas que importam os números para quem não sabe contar? As horas rodam ponteiros inexistentes, de uma era digital rápida demais até para seus amantes. Um dia hão de parar, só que não agora.
Os carros nas avenidas poderiam ser carroças, com belos cavalos escolhendo o caminho. Garis em laranja vibrante, gladiadores de espada em punho. E esses prédios de muitos andares, castelos contendo donzelas e dragões imaginários. Tudo possível, mas não existe mais vida. Só o rodar contínuo rumo a coisa nenhuma, lugar qualquer, destino talvez.
Uma, duas, três quatro almas vazias sobem no coletivo lotado. Nele, quarenta outras já em pé, pacientes mudas. Anúncios com nomes e telefones são a única cor que os olhos registram, automáticos. Os músculos do corpo estirados, como a borracha gasta dos pneus sob o piso quente. A sujeira e a dureza há muito viraram parte do cotidiano. Não se pode parar quando a sociedade precisa de seus trabalhadores na ativa, e em ponto.
Elas continuam, para sempre rodando. Enquanto dentro, a mulher abre os olhos e respira, afastando a tontura com um mover de mão. Foi apenas um quase desmaio, dentro do ônibus cheio. Se teve a impressão de escapar por minutos e ver as coisas de fora, realmente não foi nada. O sol ainda brilha como a estrela que irá profetizar o fim do mundo – por uma chuva de asteróides, quem sabe. Mas (agora sabemos) não será preciso, pois o mundo dará conta muito bem de si mesmo.

1 Comments:

Blogger Katia K. said...

OBS: Este texto é (quase que) puramente ficcional.
Eu não estou deprimida (pelo contrário :-)
Enjoy!

9:33 AM  

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